Há alguma beleza no feto de lhama que foi poupado de nascer.
Dorme sobre a lona azul um sono que ainda não conheço e por isso o invejo e o temo.
Admiro um simples feto de lhama que repousa sobre a lona azul como o céu.
Seus pequenos olhos cerrados, lembram-me os bebês que vi quando menino em vidros de formol no laboratório da escola.
Será que lhe restou algum tempo para dilemas: “sair do calor do ventre materno direto para o frio da morte ou jamais morrer em um mundo de bruxas e feiticeiros?” – Temo que sim.
Os fetos de lhama, imagino, são muito racionais e fraternos, quando se lhes dá espaço.
Há não só beleza no feto de lhama poupado de nascer, há valor.
Valor de qualquer coisa, de tudo. Pois no mundo das bruxas e feiticeiros, ou seja, no nosso mundo, o feto de lhama nos dá o que pedimos, basta falar com ele e libertá-lo do peso de ter um corpo ainda que morto.
O feto de lhama, já liberto de alma, pra se libertar do corpo, precisa ser queimado.
Todo dinheiro empregado para se ter um feto de lhama vira cinzas que viram o pedido realizado, assim se crê.
Observando o feto de lhama, notei que a maior diferença – se é que há – entre mim e ele é o fato dele ser lhama e eu gente.
A maior igualdade – observei – é que nós dois fomos feitos pra morte.
Antunes
Rio de Janeiro, 29 de julho de 2010
“Observando o feto de lhama, notei que a maior diferença – se é que há – entre mim e ele é o fato dele ser lhama e eu gente”
Muito Vinícius esse verso… Muito bom.
Abs
Excelente!!! Que texto!!!
Meu camarada, BELÍSSIMO texto! Mandou bem! Forte abraço
Concordo totalmente com o Jônatas, eu já tinha lido esse… achei que tinha comentado. Bom, mas o Jônatas falou o que eu queria, então tá valendo.