Nem o padre, nem o bispo, nem a mais virgem beata, nem Deus. Naquela hora da manhã só eu e os pombos na catedral cinza qual a manhã.
Sentei-me num degrau sujo de joelhos e pecados para ver as torres góticas a furar as nuvens pesadas, fazendo pingar as primeiras gotas pós-quaresma, suor de Cristo, choro de Deus, mijo dos anjos ou apenas a tradicional faxina que Pedro dá no céu. Meus óculos são batizados pela chuva e pela merda dos pombos. Aprecio a fé destas aves sujas e doentes de cidade, fé que as faz voar. Os pombos são nossos semelhantes, irmanados pela fumaça, pelo lixo, pelo nojo que produzem.
Fiquei ali jogado, devotando em São Francisco, fazendo de Fortaleza minha contemporânea Assis. Os pombos se aninharam em mim, arrulhando-me impropérios. Disse-lhes “bom dia, irmãos.” E desta vez cagaram-me todo. Sorri feliz, pois assim irmanei-me à catedral de Fortaleza, senti-me gigante ao ponto de tocar o céu. Eu, a Catedral, Deus, o Mundo, todos irmanados pela merda dos pombos.
Antunes
Fortaleza, 27 de maio de 2011
Nossa, que igreja linda por fora! Cheia de pombos obesos. rs Seu texto também é muito bom, mas escrito sob uma nuvem “gregoriana”, mandada por um certo Gregório de Matos. 🙂 Beijos!
Se eu fizesse uma pesquisa com o corpus dos seus textos, acho que as palavras mais recorrentes em todos eles seriam ‘Deus’, ‘Merda’, ‘Mijo’, ‘Pombos’, ‘Drummond’, ‘Igreja’…
Muito maneira a catedral por fora, por dentro é sem graça.