Arquivo da tag: Joycilene

Joycilene, a passista da Intendente Magalhães

Minha irmã está naquela fase de não querer ficar o carnaval dentro de casa, mas tampouco descobriu ainda que a melhor opção para o carnaval é realmente ficar dentro de casa. Busquei-lhe, então, o avesso do tradicional turismo, levei-a, junto com minha esposa, para conhecer o carnaval da Intendente Magalhães e o samba no pé de Jocylene Silva. O leitor nunca deve ter ouvido falar, mas Jocylene é uma passista da Acadêmicos Trás de Mim, escola de Jardim Sulacap.

Ao começar o desfile, minha irmã ainda estava incrédula sobre a magia carnavalesca que estava ali bem debaixo do seu nariz: sambistas de muletas, mendigos felizes, malandros de bigode e chapéu, reticências e etceteras de pessoas com camisas da Portela e do Império, trezegueteando pela estrada que havia virado passarela do samba. Porém, o melhor estava por vir, Jocylene Silva, entraria com a quinta escola, com seus sapatos altos um tanto rotos, com seu biquíni encravado, com suas gordurinhas que a humanizavam, com seus cabelos loiros e cacheados sobre a pele escura.

Já era tarde, lembro bem, minha esposa, minha irmã e eu, esperávamos nossa vizinha Joycilene. À calçada, centenas de cadeirinhas de plástico ou de ferro, deixavam claro que ali era subúrbio, com pessoas esperando qualquer coisa que não fosse Joycilene, pois afinal, quem a conhecia além de nós? Joycilene entrou na avenida, sambando como se tivesse outra no corpo, rodopiando sorrisos, beijando a platéia à distância, alguns a olhavam, outros preferiam ver o único carro alegórico que trazia um São Jorge, um Ogum, chame como quiser, leitor. No meio do desfile, o salto de Joycilene quebrou. Ela tirou os sapatos e deixou-os pelo caminho. Seus pés pareciam copular com o chão, saltavam alegres, calejavam-se e se satisfaziam. Apontei e disse à minha irmã: ali vai Joycilene! Entre os outdoors e o cheiro de mijo, entre os cães perdidos e as crianças de bate-bola, entre as carrocinhas de cachorro quente e os banheiros químicos ia a passista de olhos fechados, ia feliz a imaginar-se no sambódromo, imaginava até o close que lhe dava a Rede Globo e já ouvia a voz do apresentador do desfile que dizia: samba, Joycilene, levanta essa Marquês de Sapucaí!

Texto: Antunes / Ilustração: Rogerio Tadeu Rio de Janeiro, 5 de abril de 2010