Domingo de páscoa.
Saindo em Meireles, virando à esquerda, passando pela região da feirinha, passando pelo monumento de Iracema, fui em direção à Ponte dos Ingleses. Ao chegar, vi o Pirata e juro que ouvi umas risadas estrondosas como a do Almanegra. Nas casas antigas, num canto esquecido da praia, o vento se debatia sozinho e ruidoso, querendo trazer de volta a alma dos mortos arrastados por Iemanjá. Apertei o passo antes que a tarde se fosse. Ajeitei minha carteira e a câmera no bolso. Era eu e mais ninguém, até que surgiu a voz:
– Caiu! Caiu! Caiu!
Olhei para trás e vi dois homens: um barbudo com cabelo comprido, o outro cego dum olho. Insistiram: caiu aqui do teu bolso. Me aproximei agradecendo. Quando cheguei perto, não era nada, estava dado o golpe.
– Ih, foi mal, mané. Mas, aproveitando que tu tá aqui, bora bater um papo.
Os dois me conduziram até um banco na beira da praia. Minhas pernas bambeavam enquanto eu fingia não estar nem aí. Os olhos do barbudo de cabelo comprido ardiam em fogo.
– De onde cê é?
– Sou do Rio.
– Ih, que coincidência, eu também sou. Nasci na Ilha do Governador. Que cê faz?
– Sou professor.
– Cê fuma um bagulho?
– Não.
– Eu também parei.
– Ah…
– Aí, vou te apresentar uma parada.
O sujeito meteu a mão no bolso como se fosse tirar uma arma, o caolho lhe dava cobertura. Ao invés disso, sacou três aranhas e um escorpião feitos de arame.
– Tá vendo essas aranhas, cumpadi?
– Tô!
– Então, rapá! Essa é a melhor aranha que tem, pois não morre nem quebra.
Com a mão fechada ele lascou uma porradaça no bicho que permaneceu exatamente como estava. Eu, seguindo o seu exemplo, fiquei imóvel e mudo.
– Então, cê vai ajudar a gente. Deixa 20 Reais e leva os quatro bichinhos.
– Não tenho.
– Como não tem?
– Não tenho, cara. Sou professor, não tô aqui de turismo.
– Cara, você tá querendo dizer que meus bichinhos não merecem seus 20 Reais?
– Claro que merecem, mas não tenho. Desculpe.
Nisto, surgiram quinze meninos de rua sem camisa, cabelos embaraçados, sujos, ferozes como um bando de babuínos, espertos como capitães de areia. Rapidamente, eles nos farejaram e nos rodearam. Se minhas pernas já estavam bambas, perderam a força de vez. Sentei no banco. Ficamos os dois artesãos de aranhas e eu rodeados pela ciranda de meninos. Senti-me o mais rasteiro degrau na hierarquia alimentar. Só não contava que meu predador natural, o Aranha, fosse me salvar daquele cardume de crianças. Foi assim: de repente, aquele esquisito homem barbudo e cabeludo, escoltado pelo seu amigo, começou a gritar:
– Fora! Fora! Fora! Saiam!
Ele gritava e se debatia em desespero, como um leopardo atacado por babuínos. Fazia uns sons guturais , pulava e gritava no ar: grrrrrrrrrrrr. grrrrrr. Eu esperava o momento em que fosse acordar daquele pesadelo, mas isto não acontecia. Depois de uns demorados segundos, os meninos debandaram. O Aranha voltou-se pra mim:
– Os nativos daqui não são de confiança. Agora já podemos voltar pro nossos negócios.
Abri a carteira, mostrei pra ele o lado esquerdo em que estavam à vista 4 Reais. O lado direito escondia os 20 Reais que ele queria. Tentei continuar com a tapeação:
– Cara, só tenho 4 Reais, é o que posso te dar.
– Então beleza, passa isso aí mesmo.
– Mas eu levo uma aranha – estendi a mão e peguei.
– Tem uma moeda aí que vi na tua carteira. Passa aí.
– Toma, são só 50 centavos. Posso ir agora?
– Mete o pé.
Assim que saí, vinha outro caminhante distraído. Era um sujeito vagaroso e incerto como uma mosca. O calçadão de Iracema era como uma imensa teia de aranha. Páscoa é dia de banquete.
Antunes
Rio de Janeiro, 23 de maio de 2011
Minha caminhada pela Orla
Rumo ao Pirata, o cenário é composto por mar que quebra nas rochas e um navio abandonado
A Orla de Fortaleza vazia, me assistia a andar junto aos fantasmas
E a cada passo as ruas se tornavam mais vazias e eu mais solitário
Iracema, símbolo de Fortaleza
O vento quebrava nas casas abandonadas
De frente ao mar está o PIRATA de Fortaleza
Eu diante do Pirata. Toda segunda-feira, dizem: cerveja, prostituição e música.
O local onde fui surpreendido pela Gangue do Aranha.
Assim que me livrei deles, corajosamente, me distanciei e tirei uma foto, são aqueles que estão no banco do canto inferior direito, já aplicando o golpe em outro
A Aranha de arame que me custou 4,50 no golpe que levei em Fortaleza